O Cemip edita o livro O Cogumelo Dourado da obra inacabada do cineasta Odilon Lopez.
O jornalista Yuri Victorino do Cemip encontrou parte de um pré roteiro cinematográfico durante a organização do seu acervo. O material fora elaborado nas décadas de 1980 e 1990 com o cineasta Odilon Lopez. Victorino restaurou e finalizou a obra em 2019 transformando-a em uma novela. O lançamento da obra aconteceu em dezembro de 2019. O jornalista fez um breve comentário sobre este trabalho de resgate literário executado pelo Centro de Memória e Informação (Cemip):
A Novela – O COGUMELO DOURADO – foi estruturada no Realismo Mágico também conhecido por Realismo Fantástico. Envolve a cultura da tecnologia e da superstição como forma de reação através da palavra, contra os regimes ditatoriais dos tempos atuais. A obra busca verossimilhança ao fantástico e ao irreal. Surgiu do argumento original da obra inacabada de mesmo título do jornalista, escritor e cineasta Odilon Albertinense Lopez, com quem tive o prazer de conviver por vários anos e participar da construção do texto inicial. Lopez argumentava que O COGUMELO DOURADO deveria ter a cara de um roteiro cinematográfico.
Yuri Victorino sentado e Odilon Albertinense Lopez de pé na sala da casa da Barão de Ubá em 1995.
Muitas ideias do original foram frutos de intermináveis conversas travadas na sala da casa de número 194, da Rua Barão de Ubá em Porto alegre. As longas conversas aconteceram durante os finais de semanas dos anos 80 e 90 do século passado. O rascunho me foi presenteado na época pelo Lopez sob a alegação: “Faremos um filme”. Infelizmente o Odilon se foi em 2002 e não tivemos tempo nem recursos para rodar a película. Porém um livro baseado nas lembranças agora me pareceu possível editar.
O rascunho ao qual me baseei foi resgatado recentemente de alfarrábios por ocasião da organização do meu acervo no Centro de Memória e Informação (CEMIP). Com o achado em mãos fiz contato com os filhos dele, a amiga Vanessa e o amigo Juliano, falando que gostaria de reescrever sobre o argumento original. Eles me autorizaram e lhes sou muito grato.
Contei com o auxílio luxuoso de pessoas amigas, maravilhosas, como a bibliotecária e cientista social Caroline Silveira Sarmento, os chargistas e cartunistas Bier e Santiago que foi o responsável pelas ilustrações, o arquivista Cláudio Teixeira Júnior, a jornalista Célia Victorino, a psicóloga Paola Victorino, a especialista em marketing Daiane Mesquita e o jornalista e editor Dinarte Albuquerque Filho, entre tantos outros que, de alguma maneira, contribuíram para a realização deste impresso. O livro foi editado pelo Cemip em colaboração com a Liddo editora de Caxias do Sul (RS). Dito isso vejamos então a introdução.
Esta estória se passa nos anos 80 do século XX. O argumento original é fruto da época e do contexto, farto em preconceitos, machismo e coisas do tipo não muito diferente de hoje. Após várias releituras e ajustes busquei amenizar o discurso, sem que ele fosse totalmente excluído, pois fez parte da narrativa. Era o tempo de quando o mundo se dividia em grandes blocos econômicos, políticos e sociais, trajados de socialistas, comunistas e capitalistas que no fundo eram gatos do mesmo saco em busca do poder. Alguma semelhança aos dias de hoje? Época da publicação do padrão da ethernet, da tecnologia para redes locais, do telefone discado e do computador arcaico. Estávamos engatinhando. Recem a empresa Apple lançara o computador Macintosh. Na década de 80 os pesquisadores Luc Montagnier e Robert Gallo identificam o vírus HIV, nasce o primeiro bebê de proveta no Brasil e é identificado, por climatologistas, o buraco na camada de ozônio. Ainda escrevíamos cartas em papel e pedíamos ligações pelas telefonistas em centrais telefônicas. Haviam os telefones públicos de fichas.
Naquele tempo ocorre na União Soviética o pior acidente nuclear da história. A catástrofe na usina nuclear da cidade de Chernobyl, levando a morte milhares de pessoas. Também houve a aparição do cometa Halley. Nos Estados Unidos, instantes após o lançamento, o ônibus espacial Challenger explodiu no céu.
O mundo assim como hoje estava em polvorosa. A Argentina assume as Ilhas Malvinas. Começa a Guerra das Malvinas entre Argentina e Grã-Bretanha. No mesmo tempo ocorre o fim da guerra entre Irã e Iraque e a retirada da União Soviética da Guerra do Afeganistão. No final da década estava prestes a ocorrer o desfecho da Guerra Fria com a queda do muro de Berlim.
No Brasil acontece a fundação do Partido dos Trabalhadores em São Paulo. Rondônia, Amapá e Tocantins deixam de ser territórios e passam a estados da federação. Surge o Movimento das Diretas Já, que pedia a volta das eleições diretas para presidente do Brasil. Tancredo Neves é eleito, de forma indireta, presidente do Brasil. Porém, morre antes de assumir o cargo. Assume o vice-presidente José Sarney. É o princípio do fim da Ditadura Militar no Brasil. Também é quando foi promulgada a Constituição Brasileira que tornou o racismo crime inafiançável e estabeleceu a plena igualdade jurídica entre homens e mulheres por exemplo.
No mesmo período foi criado no Brasil o Plano Cruzado, o famoso plano econômico do governo Sarney que visava reduzir a inflação com tabelamento de preços, onde todos eram “fiscais do Sarney”. O Mundo passava por uma grave crise.
Mas nem tudo era má notícia. A música traria ótima safra como o cantor norte-americano Michael Jackson que faz sucesso mundial com o álbum Thriller. Aparecem cantores e bandas Internacionais que fizeram sucesso como o Bon Jovi, Def Leppard, Duran Duran, Pet Shop Boys, Prince, Madonna, Guns N’ Roses, U2, Iron Maiden, Van Halen, INXS, Whitesnake, Cyndi Lauper entre outros. No Brasil é a vez de Blitz, Paralamas do Sucesso, Titãs, RPM, Cazuza, Engenheiros do Hawai, Biquini Cavadão, Ultraje a Rigor, Kid Vinil, Ira, Barão Vermelho, Camisa de Vênus, Leo Jaime, Legião Urbana, Arrigo Barnabé, Racionais MC’s e tantos outros.
Na linha da Cultura Pop há o lançamento do filme Star Wars: O Império Contra-Ataca. O cineasta Stanley Kubrick lança o sucesso do terror “O Iluminado” e acontece a estreia nos cinemas do filme “E.T, o Extra Terrestre” e o escritor italiano Umberto Eco lança o livro O nome da rosa. No Brasil, Marcelo Rubens Paiva edita o Feliz Ano Velho e o cineasta Glauber Rocha lança o filme Idade da Terra.
A década de 80 foi considerada como o fim da era industrial e início da era da informação. Porém não havia telefonia celular, a internet engatinhava. Homofobia, machismo e racismo estavam por todas as partes.
A novela gira em torno da história dos quatro personagens de uma família de classe média.
O Edmundo, a Vera, a empregada Guajira e o filho Júnior formavam uma família branca tradicional brasileira dos anos 80.
Edmundo é professor universitário em Instituição pública federal. Pós-Doutor em Física Nuclear. Já passara dos cinquenta anos. Sujeito conservador, homofóbico e machista. Assim como a maioria do círculo de amizades deles. Com o metro e oitenta de altura, grandes olhos verdes e cabelos castanhos grisalhos possui o jeito atrapalhado de ser. Um jeito quase cômico de andar e se expressar fisicamente o que lhe tornava mais agradável em contra partida ao discurso cínico e preconceituoso que quase sempre estava presente.
Vera é Relações Públicas e Guia de turismo internacional. Trabalha como freelancer para diversas empresas. É uma mulher que já passou dos quarenta anos e que se preocupa bastante com a forma física, por isso busca constantemente cuidados com o corpo. Independente financeiramente, mas refém emocionalmente do casamento faz com que ela almeje uma relação diferente. Elegante nos seus um metro e setenta centímetros, com olhos e cabelos castanhos é dona de um caminhar altivo. Possui personalidade forte e firmeza nas suas posições.
Guajira é a empregada de dezoito anos. Filha de pequenos agricultores descendentes de colonos alemães. Uma jovem que busca na capital a possibilidade de estudar e melhorar de vida. Além de empregada é babá. Cuida da casa e do filho do casal. Mulher de estatura mediana e de olhar profundo, acentuado pelo azul dos olhos, tem cabelos loiros e pele alva que atrai a atenção Edmundo.
Júnior é o filho. Tem pouco mais de dez anos. Um menino esperto, carente e inocente. Alguém que está descobrindo as verdades da vida. Muito apegado à família, aos seriados de terror da televisão e ao fliperama. É franzino de cabelos ruivos cacheados.
Moravam em Porto Alegre em um bairro que se transformava rapidamente, onde as casas e moradores humildes davam lugar aos mais avantajados economicamente. Onde havia mato e malocas agora se construíam casas e condomínios para a classe média, expulsando os que ali viviam há décadas. Sinal da crueldade dos novos tempos.
A casa é uma construção típica dos anos 70. Centralizada no meio do vasto terreno, chegava-se até a porta principal feita de ferro torneado envidraçada com vidro canelado, através de um pequeno gramado, sem muros, apenas ornamentado por vegetação que lembrava os jardins do Roberto Burle Marx. Ao lado esquerdo da porta existe uma grande janela de madeira envidraçada e à direita a entrada da garagem. Por fora, a casa era pintada de branco e sobre toda ela, antes da chapa do telhado de concreto, corria uma faixa lilás de fora a fora.
Atravessando a porta principal se chega a um longo corredor que corta a casa de frente à fundos. À esquerda ficava a grande sala de estar que se tinha acesso por uma vidraça corrediça. À direita do corredor se tem a visão das grandes janelas que davam acesso à garagem.
Da sala de estar se chegava à sala de jantar e consequentemente até a cozinha. Da cozinha se tinha acesso novamente ao corredor que levava aos quartos, banheiros e a lavanderia. Junto à lavanderia está o pequeno quarto da empregada.
A decoração interna remetia aos anos 70. Muita madeira, lambris, vinil e xadrez. Cores vibrantes e recantos psicodélicos. No chão, carpete. Na cozinha ladrilhos portugueses. Nos banheiros azulejos rosa claro e louças verde água.
Na sala de estar uma lareira, móveis rústicos em couro e luminárias laranja e vinho. A iluminação artificial se dava através de luz indireta dispostas em lustres baixos, abajures coloridos e fluorescentes embutidas nas colunas que dividem os ambientes.
O grande corredor era iluminado pela luz natural que atravessava as grandes janelas envidraçadas, cuja o sol provinha de um pequeno jardim de inverno que separa a casa a garagem. Nele, ao longo do trajeto deparava-se com imensas samambaias e avencas que caiam do teto até o chão. No fim do corredor havia um gabinete que Edmundo e Vera usavam para trabalhar em seus projetos e estudos. Havia uma biblioteca e um arquivos com documentos dos projetos do professor.
No mais tem que ler o resto do livro pra ver o que acontece depois… Ah! A primeira edição já está esgotada. Mas em breve sairá uma segunda edição só que virtual. Aguarde.
É o Cemip cumprindo com o seu papel de preservar e divulgar a Memória e a Informação.